Neste dia 15 de agosto, um feriado estadual lembra
uma importante data histórica para o Pará: Sua adesão à independência
do Brasil. Até os dias de hoje, percorrendo a Cidade Velha ou o bairro
da Campina, os primeiros de Belém, ainda é possível observar resquícios
da colonização portuguesa na Região Amazônica e justamente esta estreita
relação dos paraenses com a população lusitana foi o principal motivo
para a tardia adesão da então Província do Grão-Pará à nova Nação,
criada pelo grito de Dom Pedro I, às margens do Ipiranga, em 1822.
Para a professora da Faculdade de História da Universidade Federal do
Pará (UFPA), Magda Ricci, a adesão do Pará à independência do Brasil é o
momento histórico no qual começa a ser traçada uma identidade
brasileira entre o povo paraense, até então, isolado do resto do País.
“É um momento especial de formação de uma identidade local. O que
nasceu mais rápido foi um sentimento de pertencimento ao Pará. A adesão
do Pará e a dos paraenses à causa brasileira, em 15 de agosto de 1823,
foi o primeiro passo para a formação de uma identidade patriótica
maior”, explica a historiadora.
Províncias
- A pesquisadora conta que, até 1822, o Brasil que conhecemos, hoje,
era dividido em duas províncias: A do Grão Pará e Maranhão e a do
Brasil. O contato das elites e as trocas comerciais e culturais locais
eram realizadas, diretamente, com Portugal e havia pouco diálogo com a
província irmã no sul, o que, atualmente, é chamado de Brasil. Até 1815,
com a transferência da Corte Portuguesa para o Rio de Janeiro, as
províncias separadas passaram a ser uma única, batizada de “Reino
Unido”. Porém, com o retorno de Dom João VI para Portugal, em 1820,
começou uma crise no Estado, que precisava decidir se deveria aliar-se
ao Brasil ou permanecer ligado a Portugal.
“O Pará foi o primeiro local a aderir à causa revolucionária
portuguesa, pois significava poder político para Lisboa e o Pará poderia
ter mais liberdade política e econômica. Contudo, com a declaração da
independência, as cortes de Lisboa se radicalizaram e ouviam, cada vez
menos, os deputados que estavam fora de Portugal”, narra Magda Ricci. A
elite da cidade de Belém era ligada à nação lusitana de várias maneiras,
desde a relação comercial com portugueses da cidade do Porto até a
presença de militares lusitanos que eram fiéis ao antigo monarca e que
pouco conheciam o jovem imperador Dom Pedro I.
Para
integrar o País, Dom Pedro enviou uma frota que deveria seguir até a
Bahia para incentivar a adesão à causa da independência. Os militares,
porém, seguiram até o extremo norte, no Pará, e, em um blefe, afirmavam
que eram o primeiro de uma frota de navios que invadiria o Estado, caso
os paraenses não aceitassem, pacificamente, se tornar brasileiros.
Quando as elites perceberam o golpe, era tarde demais e elas já estavam
politicamente obrigadas a assinar o documento de adesão.
“Contudo esta tomada não mudou muita coisa na vida dos paraenses,
especialmente na vida dos mais pobres e dos escravos, dos povos
indígenas e dos mestiços. Deixamos de pertencer ao império português e
passamos a pertencer ao império brasileiro. Havia uma expectativa de
mudanças, especialmente entre os paraenses natos. Todavia nada disso
ocorreu e rapidamente eclodiram revoltas. A do brigue palhaço foi a mais
conhecida e trágica”, aponta a historiadora.
O processo de adesão no Pará foi complexo e delicado, já que bastava
assinar um documento e jurar fidelidade ao novo monarca para ser
considerado brasileiro e manter seus títulos e poderes no Estado. Essa
situação revoltou parte da população paraense.
“Três meses após a adesão, uma revolta das tropas paraenses foi
duramente reprimida. Exatos 256 paraenses que lutavam por cidadania e
direitos iguais aos dos portugueses que aqui viviam foram confinados no
porão do Navio São José Diligente e morreram asfixiados, sufocados ou
até mesmo fuzilados. Este episódio marcou um momento de consciência
política e de identidade local. Nasceu ali um forte sentimento de
identidade paraense que irá explodir mais tarde em outras revoltas, como
na sangrenta Cabanagem, que explodiu em 1835.
Incertezas e dúvidas
- “A dúvida maior era a de se descobrir como se tornar ‘brasileiro’”,
explica Magda Ricci. Para alguns paraenses, ser brasileiro era aderir ao
movimento liderado pelo Rio de Janeiro; para outros, era ter nascido no
País. “Assim, depois da adesão de 1823, houve ainda um tempo de
incertezas e dúvidas. Se a elite local estava dividida, a população mais
pobre e os escravos de origem africana perceberam rapidamente que a
independência não mudou suas vidas e, diante da fragilidade da elite,
poderiam também fazer uma revolução mais ampla para mudar suas vidas.
Tudo isso culminou em muitos levantes e mortes, que se concluíram com a
sangrenta Cabanagem de 1835.”
De acordo com a pesquisadora, esse processo de construir uma
identidade brasileira no norte do Brasil ainda não se encerrou e
permanece “até os nossos dias, quando é preciso lutar para se fazer uma
identidade nacional mais ampla e formadora de uma cidadania plena”,
considera.
Arquivo Público guarda documentos e história do Pará
- A ata de adesão, com as assinaturas dos cidadãos e os ofícios
trocados entre as autoridades de Lisboa e do Rio de Janeiro com as do
Pará estão guardadas no Arquivo Público. Os jornais
O Paraense e o
Luso- Paraense,
que retratavam a época, também estão arquivados no local. Nesta
quarta-feira, 15, este episódio da história paraense completa 189 anos e
ainda é pouco lembrado pela população paraense. “Todos estes são
periódicos muito efêmeros e pequenos em número de páginas. Contudo são
peças fundamentais de divulgação de ideias e demonstram bem o clima
político acirrado que existia então”, conclui Magda Ricci.
Texto: Núcleo de Imprensa e Informação da Assessoria de Comunicação da UFPA
Fotos: Alexandre Moraes e Reprodução
Fonte:http://www.portal.ufpa.br/imprensa/noticia.php?cod=6432